16.5.08

Recorte de jornal


As pessoas na rua a olhavam; com olhar curioso porque algo nela estava diferente, muito embora ela mesma não se sentisse diferente naquele dia. Ou melhor, ela sentia-se um tanto melancólica, nostálgica, até mesmo um pouco absorta, porém não deprimida; e aquele dia era tão-só um dia a mais de trabalho.
Mas foi quando se olhava no espelho do elevador, conferindo se a roupa estava impecável, que descobriu o motivo dos olhares: estava em preto-e-branco. Enquanto o mundo todo à sua volta insinuava seus matizes e suas infinitas tonalidades coloridas, sua pele, seu cabelo, seu lábio, seu olhar e suas roupas oscilavam nas diferentes graduações do cinza.
Ficou um tanto desconcertada, no entanto quê podia fazer? Tentou retocar o batom; sem efeito: seus lábios apenas ganharam um contorno mais definido em tom cinza escurecido. Foi ao banheiro, lavou o rosto, mas na pele a mesma palidez acinzentada.
Dirigiu-se à sua sala, porém sentia-se esvaziada a ponto de sequer conseguir dimensionar o que se passava. E quando tocou a cadeira, o estofado perdeu a cor e assim com cada objeto que tocou: todas aquelas cores vivas, luminosas, vibrantes viraram um punhado de cinzas médios, claros e escuros, indo da plenitude completa das cores até a ausência delas.
Em desespero, chamou pela colega ao lado. Esta mulher até virou-se em sua direção, mas perdeu o olhar ao longe, como se o seu chamado de ajuda fosse apenas um sussurro incompreensível do vento, como se ela fosse alguém congelado no tempo passado. Tão igual, tão igual à moça do recorte de jornal da fundação da empresa emoldurado na parede.



Imagem de autoria desconhecida.

1 comentários:

Anônimo disse...

intiresno muito, obrigado