29.7.08

Nossa história


Você me perguntou por que não carrego tua foto comigo; lembra? você me perguntou isso e eu titubeei em responder: era porque não sabia a resposta; quero dizer, nunca me passou pela cabeça porque não carrego tua foto comigo, mas se você ainda aceitar minha resposta... é que se eu carregasse tua foto, só iria me lembrar de você – não que você não seja importante – e carregando todos esses presentinhos que você me deu (o nariz de palhaço, o chaveiro de cachorrinho, o bilhetinho dobrado em coração, o recado na minha agenda, o perfume que você me deu) eu me lembro de todos os momentos que passei com você e de toda a história que há entre nós dois e tudo o que você passou a significar pra mim e isso faz você muito mais importante pra mim.

Imagem: Heart me, de Shiritsu.

14.7.08

Meninice


O passeio de sempre, pouco mais de três quadras, da casa ao armazém e da venda para a casa. Passeio que costumava fazer umas duas vezes por semana com a mãe. No caminho pouco conversavam, as trocas de olhares eram mais comuns. O passeio lhe rendia alguns doces e o aluguel de um jogo de vídeo-game para distrair a tarde.
Mudava o dia, mas o passeio o mesmo, o mesmo silêncio cúmplice de mãe e filho, os mesmos doces e o mesmo jogo, sempre. E essas eram suas mais doces lembranças da meninice.


Imagem de George Marks, escolhida por Gustavo Muniz.

3.7.08

O clubinho


Haviam fundado um clubinho, os quatro. Por três dias durou o impasse da eleição do presidente, devido a empate entre dois integrantes. Nesses três dias, realizaram nove eleições; em todas o empate. Eis que por fim concordaram que o clube teria dois presidentes e que as decisões deveriam ser tomadas em conjunto. Cada presidente exigiu a si um vice-presidente: os que não haviam disputado a eleição ficaram pois sendo os vice-presidentes.
A tesouraria ficou com o presidente menino e como secretária, a vice-presidente menina. Estipularam que cada integrante do clube contribuiria com cinqüenta centavos por semana, presumindo que em um mês teriam algum dinheiro substancial para começar de jure as atividades do clubinho.
Inventaram as vestimentas: aos presidentes uma manta por sobre os ombros e os vices usariam um lençol, também sobre os ombros. Cada presidente empunhava um martelo, desses de bater carne, como instrumento de decisão: batido o martelo, assim passava a ser.
Faltava-lhes uma sede, talvez se dobrassem as contribuições conseguiriam montar algo, mas os cálculos revelavam que desse modo a sede só ficaria erguida oito anos e meio depois.
Mas sobreveio à presidente menina que bastavam algumas ripas cortadas de árvores que eles montariam uma barraca e cobririam com lençóis e mantas. E assim fizeram; uma barraqueta de dois metros quadrados, iluminada por uma lanterna. Na primeira reunião, todos tiveram que dar a primeira contribuição, mas o vice-presidente menino esqueceu sua parte e foi multado em vinte centavos a ser pago no próximo encontro.
A reunião, considerada extraordinária, terminou com a mais importante decisão do dia: deliberaram os quatro que em quinze minutos começariam a brincar de se esconder. Os presidentes bateram o martelo e os quatro desmontaram a barraca e tiraram as vestimentas protocolares o mais rápido possível para que não perdessem o horário do esconde-esconde.

Imagem: Hide and seek, de Friedrich Eduard Meyerheim.