26.10.10

A rosa e a canastrinha


Emília tinha uma canastra, na verdade uma pequena caixa de madeira com um fecho longe de ser uma fechadura a chaves. Aliás, ela nem se chamava Emília, tinha um nome há tanto tempo não chamado que foi esquecido. Ficou Emília, como são todas as Emílias que distraem os dias colhendo lembranças da vida.
Emília era criança demais para se dar conta de que a canastra era mágica. Guardou a tesourinha de uma perna só e, quando a pegou de volta, ela tinha as duas pernas; o relógio estragado soou o despertador horas depois de ter sido colocado na canastra; a bonequinha rasgada saiu dela costurada. Até a conchinha quebrada que Emília acabou de guardar irá se refazer.
Para onde ia, Emília carregava a canastrinha. Guardava e tirava dela as brincadeiras inventadas. Estava sentada na calçada em frente de casa, quando uma forte brisa lhe trouxe uma figurinha, daquelas que vem com as balas de cereja. Era um desenho que Emília não entendeu direito e havia algo escrito, mas a menina não sabia ler.
Uma brisa mais leve desviou seu olhar para um pontinho vermelho que rolava pelo chão. Emília levantou-se e vou atrás dele, tentou pegá-lo algumas vezes, mas a brisa sempre o empurrava para mais longe. Quando conseguiu, não soube distinguir ser uma pétala, apenas percebeu sua maciez e guardou-a na canastrinha. De repente viu outro ponto vermelho pairando no ar. Pulou uma, duas vezes e na terceira conseguiu pegá-lo: era outra pétala. E assim foi pegando todas as pétalas que vieram com o vento.
Voltou a sentar no chão e abriu a canastra para contemplar todas aquelas pétalas, que faziam uma espécie de tapete vermelho na caixa, que envolviam os outros tesouros que ali guardava. Distraída, não viu um rapaz passar por si; também não viu desprender das mãos dele uma pétala vermelha. Quando a notou, correu pegá-la e fitou, mais à frente, a rosa jogada; nela a última pétala. Mirou o rapaz, que já ia longe.
Emília sentou-se ao chão, tomou a rosa e cuidadosamente guardou-a na canastrinha. E então correu, com toda a velocidade que suas pernas conseguiram alcançar, correu com a única certeza de que alcançaria o rapaz. Quando chegou nele, tocou em sua mão, chamando-lhe a atenção. Abriu a canastra e tirou a rosa, inteira, robusta, bonita e cálida e disse, entregando-lhe a flor:
“É tua rosa, Julian... e dela precisas cuidar”.


Imagem de autoria desconhecida.