16.12.09

A gente agora já nao tinha medo


Ele sabia: no fim, havia apenas a certeza de estar sempre começando. Sabia que era a vida, mais que a morte, a que não tinha limites. E deveria viver corajosamente. Mesmo que não soubesse para onde ir.
Mas foi, no sozinho do vago, que compreendeu, que acordou para uma história sem névoas. Bastava começar, começar pelo começo, seguir até o final e então parar; para o viajante que não sabe para onde quer ir, qualquer mapa serve. E pôs-se a caminhar...
De fato, era um dos homens bons; mesmo que não o enxergasse, ele carregava o fogo. Todas as estradas, todos os mapas, todos os rumos levavam-no a ela. E sua própria consciência o inquiria: “há quanto tempo não te arde o coração?”.
Olhando nos olhos, disseram-se, assim eles dois, coisas grandes em palavras pequenas, ti a mim, me a ti, e tanto. Porque o que há é homem humano, e as pessoas não estão assim terminadas. E se, das habilidades que o mundo sabe, a que faz melhor é dar voltas, a vida não era mais do que essa sucessão de faltas. E falta, ela lhe fazia demais.
Deram-se as mãos. Viver é muito perigoso, mas ao lado dela era saborosa aventura. Sussurrando ao ouvido dela, disse-lhe: “não solta da minha mão”. Fosse uma estrada ou o mundo inteiro, ao lado dela bastava-lhe sonhar. E disse: “como é simples! A gente agora já não tinha medo”.


*Conto-colagem com trechos de obras de: José Saramago, Agustina Bessa-Luís, Inês Pedrosa, Cormac McCarthy, Guimarães Rosa, Lygia Fagundes Telles, Chico Buarque, Marcelo Camelo, Fernando Sabino e Lewis Carroll.


Imagem de autoria desconhecida.

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