No dia seguinte não fez o de-comer, nem o desjejum ou pequeno-almoço, nem as outras refeições do dia, sequer uma água-e-sal ou a torrada esquecida no fundo do pote de torradas. Não aderiu àquelas pirações de greve de fome; iniciava, pois seu intento de esquecer-se da vida. E, como conseqüência da barriga vazia, não fez as necessidades fisiológicas normais a um não-birrento. Deitado na cama, decidiu não mais andar e não mais andou, como também decidiu não mais mexer braços, mãos e pés e assim não mais mexeu braços, mãos e pés. Fechou os olhos e não mais os abriu, desistindo de ver as coisas todas tolas que seus olhos sem algum senso crítico lhe projetavam nas retinas.
Dormiu e não mais acordou; deixou-se ficar perdido naqueles sonhos ou dormências, mas ainda tinha vivo os pensamentos, as angústias e aquelas coisas todas encaixoladas, impregnadas tão encalacradamente.
Como último passo, decidiu não mais pensar e sua mente entrou num estado híbrido de inércia e hibernação, ficou-lhe apenas um fundo preto às idéias, sem sequer aquele fio brilhante apontando a cessão das atividades vitais. E assim esqueceu-se da vida e ficou assim até que a vida esqueceu-se dele.
Imagem: Vida, de Rodolfo Franco.
2 comentários:
Dos contos e crônicas dos blogs que até agora li, tirando alguns blogs de mulheres, este é sem dúvida o melhor! Dou enfase para o conto "A esquecer-se da vida" onde o autor mostra grande talento e afinidade com a "Palavra"!
Fico feliz em ouvir isso Alexander... é importante esse retorno...
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