27.9.08

Céu azul


Alçou vôo e sentiu-se leve por demais, capaz de ganhar os sete céus, sentiu-se livre das pequenezas humanas e das mazelas que lhe assaltavam as madrugadas. Alçou vôo e impulsionou-se livre, feliz por ganhar um mundo tão desejado seu; e percorreu o céu bailando pelo espaço, rodopiando feito folha ao vento e deixando-se levar na vastidão do azul. Alçou vôo e sentiu sua alma desprender-se de seu corpo; era sua a liberdade e a vida em essência, era-lhe seu tudo o que buscara dantes. Alçou vôo e não escutou segundos antes a freada e a buzina, como também não sentiu o impacto. Enquanto as pessoas corriam para socorrê-lo em vão, ele alçava vôo a viver a vida.


Imagem retirada de Getty Images.

22.9.08

Florzinha no cabelo


Rodopiante, alegre... a passos cadenciados ela vem e passa no doce balanço do amar. Tímida, recolhida em si, mas capaz de despertar vida. Bela donzela dos olhos doces, meigos, que enfeitiça... Que me dera segui-la, me deixar levar por ela, guiado apenas pela florzinha rosa em seu cabelo.


Imagem de Vanessa Lima.

14.9.08

Tão pó, tão só


Tudo o que tinha guardava numa pequena lata de alumínio; coisas que eram sua vida, cada qual com seu significo, mas miudezas, pequenas lembranças e experiências, porém que lhe fizeram ser o que é.
E para onde ia, carregava a lata, que por causa das estampas, parecia uma casa, porta e janelas nas laterais, a tampa desenha de telhas de barro. Vez por outra abria a lata e remexia suas coisas, com olhar saudoso, e fechava. Certeza daquilo que era sólido e certo.
Numa dessas aventuras lata adentro, tão logo a destampou, começou a ventar, dum vento forte, vigoroso, que aumentava. Na dúvida se fechava ou dali corria, colocou a mão sobre seus pertences para impedir que o vento os tomasse consigo, mas o vento era forte demais e venceu a resistência; varreu dali não só as coisas mais leves como despedaçou tudo o que estava protegido.
Levou-os longe, espalhando-os pelos cantos e curvas ermas e ele sequer pode agarrar entre os dedos um mínimo pedaço de si. Sem sua latinha, sem nada, sem aquilo que lhe fazia ser o que era, tudo pareceu tão pó, tão só.


Imagem de autoria desconhecida.

2.9.08

A musa e o poeta


Às vezes falha-me a pena, acomete-me a estranha sensação de sentar ante a folha em branco e sentir as palavras impulsionarem sem levantar vôo. Como também falha-me a coragem, a capacidade de me entregar aos prazeres do mundo, de dizer as palavras singelas a ela; um medo pueril, uma dúvida acanhada e malévola, uma incapacidade de deixar minh’alma falar. Procurei as respostas certas às minhas perguntas errada, até que me dei conta de que a todo poeta inspira-lhe uma musa.
Saí pelo mundo à procura da minha, numa viagem tresloucada, feito um desvairado a caçar nos olhos de cada mulher a inspiração para minha arte. Tateei no escuro, embrenhei-me por becos e caminhos nunca dantes pisados, no entanto minha musa parecia mais bem escondida do que imaginava. Desenhava-a linda, capaz de preencher meu vazio, de acalentar minhas madrugadas insossas, de alumiar meu pequenino coração.
Ao vê-la perguntei-me: serão os poetas cegos? Minha musa estava ao meu lado, linda como a pintei: de cabelos negros, longos e luzidios, dum mesmo brilho cálido em seus olhos puxados, e pele morena do sol. Minha musa pegou minha alma e me levou pela noite de lua cheia, fulminou certeiro meu coração: fiquei estatelado, hipnotizado feito estátua de pedra. Minha musa me beijou, um beijo carinhoso... gostoso – fiquei querendo mais. Minha musa me inspirou, mas sou mau poeta: não verso, proseio.


Imagem retirada de DecksittersPhotoBlog.